segunda-feira, 29 de abril de 2019

Encontros

     Quando fazia graduação no início dos anos 2000, frequentemente visitava a casa paterna. Então, nos sábados pela manha, papai me convidava para ir na rua, como chamávamos martins, para comprar alimentos. Até virou costume e eu adorava. Nós íamos na moto velha moto honda 1997, que papai que tem até hoje. Aquela moto azul, até parecia ter um GPS, pois sempre fazia o mesmo trajeto todos sábados com papai no comando. Então, nós saiamos de casa e só parávamos na sombra das figueiras ao lado da venda de seu Davi e no mesmo sentido do colégio Almínio Afonso. Assim, cruzávamos a rua e entravamos na venda de Antônio do Porção que chamamos de "os Profundos". Devido ao hábito que Antônio tem de dizer que as coisas estão profundas. Bem ali, papai se sentia e se sente em casa. Solta a palavra e rir e brinca com as conversas engraçadas do povo simples, como a gente. Quem sempre encontrávamos lá era Washigton e Aluízio, sendo o primeiro filho e o segundo irmão De Antônio. Aluízio é um cabra nota 10, muito divertido e cheio de pilera para contar. Papai, com a xícara na mão começava a rememorar as histórias sobre os antigos Paté, vô Jusé... Tínhamos um stand up free. Também, encontrávamos lá Hélio de Chico-Franco, Bolinha de tio Aldo, Pedim, Marco, Marlene e Dadá de Vicentim. Era uma fuzaca só.
      Depois, partíamos para o mercado de Eide Godinho onde papai fazia a feira de carne, frutas, e o que estivesse faltando em casa. Ele tinha e tem preferência em comprar lá, pois conhece e confiar nas pessoas. Quando chegava lá já perguntava a Soró o entregador se tinha alguma caixa. Ai, para me agradar sempre pergunta se queria isso ou aquilo. Papai é uma pessoa muito generosa conosco. Coisa vinda das raízes. Vô Chiquinha mãe dele era assim e Rosângela filha dele também é uma pessoa generosa, amorosa. Encerrada a compra, partíamos para o último ponto.
      E por fim, cruzávamos a rua e já estávamos em frente mercado público que no passado tinha uma feira enorme, mas agora só encontram poucos vendedores de gêneros como verdura, louça de barro, redes, etc... Bem, um destes vendedores que conhecíamos era Chiquinho de Zé do Alívio. Aqui, coloco em destaque por ser o mais idoso vivo até ali e por isso o mais experiente e por assim dizer respeitado. Fisicamente, era baixo, com cerca de 1,60 metro de altura, sempre de bigode e com voz baixa e meio roca; gostava de usar chapéu de massa e camisa de botão.  Mesmo com mais de 90 anos ainda cultivava hortas e sempre ia vender suas verduras que eram coentro, cebolinha e alface. Creio que esse hábito era mais para passar o tempo. Porém não perdia o olho nas moedas. As vezes papai comprava um feixe de verdura e dava uma moeda de 10 centavos, quando na verdade a mercadoria custava 50 centavos. Era engraçado porque ele sempre conferia o valor e dizia que papai só tinha dado 10 centavos. Papai ria e dava o resto. Fazia só para ri.
        Então, às vezes, naquele pequeno ponto de encontro se reuniam as pessoas mais próximas, gente humilde do Porção, das Casinhas como Zé firmino o dançador ou da Serrinha. Na verdade, quase sempre eram parentes e amigos de parentes.
       Numa dessas vezes, lembro que chegou ao grupo tio Aldo que a primeira vista era muito sério.  Ele era sério, mas entre amigos era uma pessoa extremamente comunicativa. Uma das pessoas que mais conversava que conheci, assim como suas filhas. Será que as filhas aprendem com os pais? Bem, tio Aldo era alto com 1,70 metro de altura e forte com cada marra de braço, e diferente mim e de papai não era calvo, tinha sempre a face barbeada, hábito que creio ter aprendido enquanto serviu ao exército. Sabe, nem imagino sobre o que conversamos. isso faz tanto tempo foi no ano de 2001. Sei que as conversas fluíam e poderiam ser engraçadas ou mais sérias. Era sempre assim. 
       O jeito como as pessoas se portam e a forma como a cidade está organizada até pode  mudar, mas não vejo outra maneira de ser.
       O tempo passou como devia ser. Poucas pessoas daquela época resistiram ao tempo, pois somos pessoas do nosso tempo. Hoje o tempo é dos mais jovens e mudei, apesar da cidade continuar a mesma houve uma evolução das coisas. Muito de tudo foi mudado pela tecnologia e pela maneira distinta de viver das pessoas.
        Os encontros agora, são entre mim e papai em nossa casa. Já não me convida mais para ir a rua. Nos contentamos em nos encontrar em casa ele na área e eu na rede. Poucas palavras. Mas a presença mútua é simplesmente inestimável. 

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