A concepção de mundo é subjetiva, sendo a experiência sua fonte capital. O mundo é representação. Então, não basta entender o processo aparentemente linear impressão, percepção e o entendimento das figuras da consciência. É preciso viver, agir e por vezes refletir e assim conhecer ao mundo e principalmente a si mesmo. Aprender a pensar!
terça-feira, 9 de março de 2021
24 Festinha
segunda-feira, 8 de março de 2021
23. A caixa de ferramenta
A lembrança tem seu encanto,
Por vezes, nos causa espanto,
Na infância era tudo diferente
Em casa pouca coisa tinha a gente
Para nossa pequena lida tinha
Enxada, enxadeco e chibanca,
Até uma velha campinadeira
Para o mato da roça campinar
Roçadeira, facão, foice e machado,
Para tirar forragem e madeira
E o gado alimentar e o curral cercar
Um velho morão de pegar e vacinar
Na casa velha havia uma caixa de madeira
Cheia de traquitanas como pregos,
Alicate, troques e martelo, suvela,
Serrote, pua e plana gostava de chafurdava
Então foi num ano pela tarde
A uma escola fui pra lá levado
Todo mundo em fila estava sentado
Me deram um caderno e um lápis
Num quadro verda a professora
Explicava que riscos eram sons
A - E - I - O - U e A, B, C...
Vogais e alfabeto
Um caderno e um lápis
E a incompreensão e insubordinação
Tinha como punição um puxão
De orelha... Ardia e queimava,
Acho que não ligava pois sempre repetia a ação
Ah lição complicada,
Do ABCD chegar a entender o mundo
Que paciência e perseverança,
Largar a infância e se abraçar a responsabilidade
De ler e entender o mundo pelas palavras
As ferramentas de casa eram muito mais simples,
Mas a coragem faz o guerreiro,
Aos trancos e barrancos passava de ano
E ouvia um elogio e um livramento passar de ano,
Ouvia com prazer que ao menos era inteligente,
Ouvia dizer das aparências com Françuar
Comparado até nas astúcias assim cultivava
Minha inteligência pequeno era o mundo
E grande a imaginação...
E ouvi dizer que Dona Lenita era mais rígida,
Mais valente, então o medo me adestrou,
Tomei de primeira as lições, aprendi o que achava
E pontuava as escola, passei por média,
Entre ditongos e tritongos... a Bahia e o Paraguai,
Algo era uma luz e deixara de ser cruz,
Na Serrinha Grande foi a vez de Conceição,
Professora do sertão
Que chegava a serrinha,
E rezava toda manhã,
Agora mais liberdade,
Agora mais responsabilidade,
Três litros de leite e a sala de aula,
Na vergonha vendia aqueles litros,
E o dinheiro a mamãe dava,
Na escola sempre passava...
Quinta série essa foi um destroço
Era muito o alvoroço,
Estudar com professores,
Esperar aula de educação sexual,
Fui expulso da aula de religião,
Fui para quarta avaliação em matemática,
E em ciências, quase reprovei,
Ainda lembro do olhar de severo
De dona Rivete,
Lembro de Cleiton e Primo Valdene...
Edineia, Cileuda, Alessandra e Joesilha,
Sexta série Chaguinha de Viriato me salvou,
Como ave em arapuca,
Fugi de um bagunça nas últimas,
E Chaguinha professor de matemática e ciências
Me salvou da matemática,
Nas ciências me apeguei,
Adivinhe o por quê,
Ali descobri minha inteligência
O livro cheio de imagem,
De bichos e sistemas,
E Chaguinha contava as histórias do Colégio Agrícola de Jundiaí...
Muito obrigado professor,
Na sétima série não esqueço
Aula de geografia,
O mestre José Silva descrevendo as ilhas Polinésias e Melanésias...
Tomava a lição,
Naquela grande inverno,
Para a estrada ia o gado pastorar,
Com o caderno na mão
Aprendia geografia,
Virando as pedras brancas do Barroso
Em busca de escorpião,
Ai veio o professor Luiz Silva também da geografia,
Tomei gosto pelas boas notas.
Na oitava série o destaque foi Ledimar,
Professora Perpétua e Genilda,
Desculpe mas português não era minha praia...
Lembro da tarde que Drummond morreu,
A professora Genilda falou com muita tristeza.
Essa dificuldade da língua ainda carrego,
Em Martins teve a fabulosa Janildes de biologia,
O fantástico Pedro de matemática,
Oneide e Fátima de Português,
O que dizer da generosidade de drs. Moacir e Luizinho,
Josineide de inglês,
A professora de literatura que me fez pela primeira vez ler o mulato
Dona Marta esta apostou na gente...
Me divertia mesmo era na biblioteca
Ali onde ficava dona Bebeta...
Lia os livros de contos...
Fernando Sabino...
Naquelas noites frias da serra,
Não estava só tinha minhas irmãs
Nossos vizinhos e vizinhas...
Sabe os caminhos foram tortusos,
Mas descobri a caixa de ferramenta de Foucualt muito cedo,
E não teve um dia em minha vida
Que não tivesse um aprendizado,
Agradeço a todos que me ajudaram
E principalmente aqueles que me apoiaram,
Aqueles que vieram e se foram,
Seria impossível descrever...
Dedico tudo que sou a mamãe e a papai.
E fico por aqui.
22. Para além
Às vezes, a gente fica concentrado,
Fazendo atividades cotidianas,
E ouve sons de coisas humanas,
Som de longe distinto e perturbado,
Parece que ouvimos o eco do tempo,
Parece que nos perdemos no espaço,
A gente sente intensa nossa individualidade,
Sente o quanto somos solitários
Talvez tenha tido essa sensação
No estalado a queimar a maravalha,
No ferver do café com água que borbulha,
No chiado da chuva longe que vem chegando,
Na solidão noturna ouvindo um roncar...
Coisas humanas,
Coisas humanas,
Coisas humanas,
Pulsações da vida,
Que renega até a morte a morte,
Esse medo do desconhecido,
Aprendido desde o ser um bebê.
Agora ouço longe
Roncos de motores,
Ecoando nas ruas,
Longe muito longo vou,
Estou no meio do mato,
Ouvindo roncos de motores
Ecoando nas gargantas das serras,
Ecoando entre as caatingas...
Quem desconhece a cinza
Que se faz ao apagar crepuscular
De cada dia, o cantar da ave maria
Na voz de Gonzaga...
Esse profundo eco
Espelho do tempo,
Eternidade momentânea,
Num ponto é fiado é tecido
O presente e o passado
No ser...
Agora a compreensão que o entendimento está para além da experiência.
21. Paternidade
O tempo em conta gota
Sendo o sono fracionado
A noite que antes fora oculta
agora está sendo desvelada
Entre horas se ouve seu chamado
Um gemido, uma virada, uma tosse
Quando a gente olha e ver
Tanta beleza condensada
Fica hipnotizado cansado
E feliz sem perceber a noite
E seus fenômenos revelados
Frágil Belo e delicado
Necessita de atenção,
Precisa de cuidado
A paternidade é assim revelada.
domingo, 7 de março de 2021
20. Escreve
Um dia esses versos
Serão empoeirados
Serão esquecidos,
Não desaparecidos
Terá sempre uma chave
A quem quiser acessar,
A quem poderia interessar,
São imaturos e pobres
Nem sabem o que expressar,
Falta métrica e rima e emoção,
Amorfos buscam uma classificação,
Querem em um gênero se encontrar
Desejam ser objeto do pensar,
Buscam nas palavras enunciação
Buscam alguma participação
Mas como um um habitat encontrar?
O tempo e o espaço hão de se encarregar
O que vos escreve desconhece a arte
Desconhece os paradigmas e toda parte,
Sabe apenas que o oriente ama a lógica.
Matutar a palavra encaixa-la feito dominó
Encontrar a beleza na organização rimada
Me trás uma reflexão pouco embasada
Que os espaços são ocos e podem ser um só
Ocupado, limitado ou ilimitado,
Pois agora é a melhor hora
De quebrar o paradigma
O protocolo, e aqui intuir
Criar uma quimera
Que seja mesmo independente,
Particular ou universal
Que seja livre
E apesar de tudo original
Que tenha fim imediato.
19. Serrinha do Canto
Serrinha do canto
Meu amado encanto,
Meu centro espiritual,
Meus referenciais,
Em linhas gerais
Aqui sempre estou,
Serrinha do Canto
Foi onde eu cresci,
Foi onde vivi
Vivi protegido,
Vivi amado,
Papai e mamãe,
Meus irmãos e irmãs,
Nossa casinha,
Serrinha do Canto
Onde tudo começou,
As primeiras brincadeiras,
As primeiras amizades,
As primeiras orações,
Serrinha do Canto
Meu ponto de dormida,
Meu ponto de comida,
Meu sentir plena a vida,
Serrinha do Canto
Os nossos vizinhos,
Nossas famílias escolhida,
Elita e Joãozinho,
Du Carmo e João Lusso,
Chico Neco e Arlete,
Artur e Eliza,
Ribamar e Lena,
Airton e Eliene,
Zezin e Tica,
Dudé e Zé de Geremias
Hélio e Paulinha,
Crejo e Josa,
Loló e Dezu,
Seu Mundinho e Luiz,
Dequinho e Iola,
Totó e Zuleide,
Nelson e Antônia,
Raimundo Vieira e Cacau,
Antonio de Doquinha e Ziná
Diã e Neta,
Joquinha e Nena,
Juvenal e Iraide,
Adelson e Antônia,
Nelope e Luzia,
Livani e Evandro
Chiquinho do Canto e Socorro,
Bonifácio e Loide,
Tirite e Lenita,
Leci e Laurita,
Maria de Cajumba,
Tio Juice
Zé Vieira,
Miguel e Tereza,
Mané de Branca e
Dadá e Preta
Dinarte e Doraci
Deo, Nazareno, Gorete, Régia,
Zé Paulo e Elita
Jaíme e Luiza,
Chico de Joana e Daleia,
Minino e Ieda,
Vavá e Elieuza,
Neto e Júlia
Diniz e Loló,
Josimá e Elenita,
Elias e Loló...
Serrinha do canto
Minha alfabetização
Dona Livani e dona Lenita,
Não não podes imaginar
Nossas distintas relações...
As brincadeiras de criança
Fazenda, dinheiro moeda de carteira de cigarro,
Carro de madeira,
Caçada de baladeira
Caçada de cachorro,
Pegar passarim...
No inverno os banhos de cachoeira no porção
No verão o fotebol no porção e no marocão,
A biclicleta barra circular e a escola,
Nossa monareta azul,
A luz elétrica...
A televisão
Show da Xuxa,
Leandro e Leonardo
Serrinha do Canto
Um ponto entre os avós
Chico e Chica
José e Sinhá,
Tio Aldo e Tia Nevinha,
Esse meu imaginário...
Serrinha do Canto
Nossas vacas magras,
Nossos cachorros,
Nossos gatos,
Serrinha do Canto
É meu alicerce
Meu tempo e meu espaço...
Afinal quem somos nós
Parte de onde partimos,
Parte de onde saímos,
Parte do que ouvimos,
Parte do que repetimos
Aquilo que queremos repetir,
Agora é hora de matutar
Maturar,
Digerir e representar...
Serrinha do Canto.
18. Metamorfose cega do sertão
Quem conhece o sertão
Reconhece seus odores
E suas diferentes cores,
Quem conhece o sertão
Odores fortes de plantas,
Odores forte de carniça,
Odores fortes de lixo,
Quem conhece o sertão
Conhece a caatinga cinza,
Conhece o vinho do mourão de aroeira,
E o laranja ou a alva da poeira,
Conhecer o sertão
Faz parte da existência sertaneja,
é gostar de caldo de cana e rapadura
Gostar de melão e melancia,
Gostar de feijão verde,
Gostar de pamonha,
Gostar de pescar no açude,
Gostar de ouvir cantoria...
Gostar de se encontrar em festa de padroeira,
Gostar de vida simples,
Mas o sertão mudou,
Criança não come coalhada só yogurt,
Criança não brinca correndo,
Criança tem tablet até aprende inglês,
O sertão mudou,
Agora a caatinga é cheia de lixo,
Agora a caatinga é pobre de bicho,
Muita coisa mudou no sertão,
Cemitério tem telhado,
Adulto vive no celular,
Ninguém mais quer trabalhar,
Mudaram as tradições...
Quem vê o sertão de hoje,
Nem imagina como foi,
Tudo evolui
Que se adapta sobrevive
Que não se adapta morre,
Corre corre corre...
Foi o sertão que mudou ou foi sertanejo?
17. Morte
A morte é o não ser,
A morte mata todos,
A morte é o ponto final
Não da frase, mas do texto.
A gente se pergunta
O que é a morte
Quando nos cerca,
Quando nos leva
Alguém muito querido
Pensamos sem parar
Por que isso aconteceu?
A morte é caixão
É paixão,
É dor
É diluição
Desaparecer
E por fim
Adeus poesia
Morte.
16. Madrugada
Na madrugada, canta marrom a corroira
Canta, cantando vai pulando pra lá e pra cá,
Grita amarelo o bem-te-vi perto de seu ninho,
Canta laranja o sabiá que parece assobiá.
A passarada anuncia um novo dia,
Um lindo dia de março de 2021,
Um novo dia de ação dia de ser.
sábado, 6 de março de 2021
15. Estória
Numa manhã domingueira,
Segui com mamãe até o sertão,
Fomos de jegue se bem me lembro,
Lá pra casa de vovó Sinhá,
A estrada era apertada,
Com areia alva
E seixos rolados,
A gente ia caminhando
E o mundo descobrindo,
Cada árvore mais linda,
De certo era inverno,
A água escorria na terra úmida,
Era perfumada a estrada,
Um cheiro de marmeleiro,
Cheiro de velame,
A certo momento num novo lugar,
Ouvia a rolinha cantar,
Fogo-pago, fogo-pago, fogo pago...
E ao voar ouvi o som de chocalho,
Ouvi um canto lá no campo,
Era um canto maravilhoso,
Era o tico-tico do campo.
Chegando na casa de vó,
O mundo era tão amplo
E nós tão pequenos,
Ali se via serras
Eram outras terras,
Serras no nascente,
Serras no norte e no poente,
Só o sul era profundo.
Vovó nos recebeu,
Vovô também estava lá
Vimos a mana Lera
Vimos o primo Magi,
Vimos a alegria de mamãe,
Ao chegar lá se sentia em casa,
A maravaia queimava no fogão de lenha,
Queimava acabando de cozer o feijão,
Tomamos uma coisa mole e alva,
Feita de leite chamada de coalhada,
Rasparam a rapadura
Misturaram e comemos,
O que me chamou atenção
Foi o lugar onde guardava
Tal manja a coalhada,
Descansada numa forquilha,
Teve a noite dormida
E agora era comida...
Eu criança curiosa,
Achava aquilo esquisito,
Casa de taipa,
Vovó idosa,
Vovô pigarreando,
Entre eles conversando
E eu viajando,
Apenas nas formas,
Da vida nada entendia,
Só vivia,
Foi um dia maravilhoso,
Que volta sempre a minha memória,
Parece uma estória,
Mais um dia foi realidade,
Seria a realidade um sonho?
Penso agora risonho...
A casa,
A paisagem,
Meus avós são estórias e sonhos,
Coisas de minha memória,
Que compõe esta estória.
E é só.
Bati-bravo Ouratea
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