A tarde se vai e a noite chega.
À tarde sempre foi por natureza triste,
Era só sensação,
Agora, às tardes tem motivos para serem tristes...
Nestes dias papai se foi,
Seus olhos dormiram deste mundo,
Seu corpo descansou e terra se tornou.
Não verá mais o sol se esconder no poente
Enquanto a luz dourada acaricia os ramos tortos das catingueiras e juremas...
Não mais frio, papai era friorento e não reclamava do calor,
Nada mais de doce de mamão ou de caju...
Nada mais de queijo,
Nem um petisco de carne ou queijo para o lourinho,
Nem para sherlock...
Quando imaginava que papai se ia, meu peito explodia de dor.
Quase enlouqueci quando descobrimos a enfermidade como ele chamou.
Pensei... Enfermidade!
Enfermidade é melhor que câncer.
E quando caia a noite no mês enfermo, antes da cirurgia.
Quando ia dormir que lhe entregava os comprimidos...
Aqueles quatro comprimidos que tomava um a um...
Quando pegava o pinico,
Quando arrumava sua cama...
Aconchegava aquela coxa verde,
Dobrava ao meio
E dava espaço para ele rezar,
Não apagava a luz,
Beijava sua cabeça calva,
Sentia seu cheiro,
O cheiro de sua vida,
Então ele rezava,
Creio que pedia pela saúde,
Mas nunca saberei.
A oração é algo muito pessoal.
Depois de enrolado,
Ia lá beijá-lo novamente e dizer o quanto o amava.
Eu ia, Li ia, Roberto ia e Meire ia...
Aquele homem que foi tão forte um dia,
Se tornou um amável idoso,
Embora não sentíssemos isso,
A tarde caiu...
E para onde vai o dia,
E para onde vai a tarde,
E para onde foram suas orações,
E para onde foi sua alma,
Terá ouvido meus monólogos?
Meu peito papai está cheio de ti,
Acredite,
Desde o dia que me tornei pai,
Sinto que sou um pouco de ti.
E o senhor é nós,
O senhor e mamãe são a totalidade
E nós sua particularidade...
Te amo.