Temos sempre lembranças das visitas à casa de nossos avós. As casas de nossos avós são cheias de mistérios, há tanta coisa oculta a nosso pequeno mundo. Muitos dos objetos e hábitos ali encontrados não absorvidos por nossos pais e a nós é muito estranho. Na casa de vô chiquinha havia um oratório de Santo Antônio, algo meio barroco, sacro. Não sei porque, mas tinha medo daquele altar. Sempre abria para ver o que havia ali dentro, tinha essa liberdade. Todas as vezes que passava na anti-sala eu dava uma olhada, parecia uma pequena igreja. Por que ter uma pequena igreja dentro de casa?
Na sala, havia o quadro de meu pai de quando era jovem e eu não conseguia ver ali meu pai e o quadro de meus avós Chico e Chica. Tinha também várias cadeiras de balanço, mas de cordinha.
Lembro que a voz de meu avó era grossa e a de minha avó arrastada. Bom e quem interessa o tom da voz de meus avós? só para ter mais um lugar para guardar.
Não lembro de nenhum meio de comunicação lá nos meus avós, nem mesmo de um rádio. Tudo ali se contava ou era silêncio.
As noites escuras alumiadas a gás, a carne seca a sal e sol.
O doce do café e da rapadura.
A fumaça solta da lenha no fogão a lenha.
O tempo parado.
O tempo ali não escorria,
pingava.
As vezes mal chegava e já queria voltar.
Tinha muitas plantas que minha avó cultivava e não lembro de ter em minha casa.
Lembro do jasmim do lado do chiqueiro no nordeste, nas beiras das calçadas haviam vincas rosas e brancas, brancas com fauces vermelhas. Havia uma pimenteira do gênero piper, uma romanzeira, louro por todo o terreiro, roseiras e carnaubeiras.
Minha avó tinha uma horta sem faxina.
Tudo era tão orgânico.
O tempo levou meus avós e acabou com tudo.
Restam apenas as vagas memórias acima redigidas.
Mais nada.