A gente quando se interessa por plantas faz um jeito de cultivar.
No meu caso gosto de colecionar as formas, as cores através da fotografia.
A concepção de mundo é subjetiva, sendo a experiência sua fonte capital. O mundo é representação. Então, não basta entender o processo aparentemente linear impressão, percepção e o entendimento das figuras da consciência. É preciso viver, agir e por vezes refletir e assim conhecer ao mundo e principalmente a si mesmo. Aprender a pensar!
A gente quando se interessa por plantas faz um jeito de cultivar.
No meu caso gosto de colecionar as formas, as cores através da fotografia.
Mamãe mandou que fosse buscar mangas.
Mangas que forram o chão do sítio de vó Sinhá.
Bora lá Mera...
A cangalha já foi botada e os caixões também.
O jegue preguiçoso vai andando devagar.
Vai andando com suas quatro patas.
Vamos seguindo pela beira da estrada.
Já estamos em Zé de Júlio.
E avistamos as barreiras da terra de vovó.
O jegue marrento carrega o menino e a menina.
Vai andando sob a tutela dum cipó.
Para não dar bandeira vamos por tio Jessie.
Os caminhos de seixo rolado, o perfume das unhas de gatos e cipó preto encantam a caminhada.
Logo se ouve o som das águas do riacho do porção.
Logo se sente o aroma acridoce das cajaraneiras de tio Aldo.
A sobra de sua copa a terra fica coberta de esperas doces e amarelas.
Então já no porção passamos em frente a casa de Pedro Lião onde se ouve os gritos de tia Biluca.
Na casa de neta uma penca de meninos parecendo índio passam o tempo no terreiro da cozinha.
Passamos a escola e já perto de Zequinha de ver na entrada a casa de Paté.
Então chegamos a casa de vovó que não tem nenhum agrado para criança.
Vamos para o sítio da cacimba de Joel pegar as mangas.
Chegando lá até o jegue se delicia com uma delas doce e amarela.
Enchemos os caixões de mangas espadas e mangas buchas...
E voltamos pra casa em paz.
É de longe o gosto de mamãe por mangas.
A manhã se passa só nessa atividade.
A gente era rico e não sabia.
Com uma vó com um sítio de mangas.
A sabiá miou na sobra da cirigueleira,
Miu... Miu...
A terra de barro molhado,
Miu... miu...
A era florida de flores lilás,
Miu... Miu...
O capim flocado áspero mole,
Miuuuu.
Miu, miu, miu...
A Pimenta malagueta está rubra enfeitada.
Pec... Pec... Pec... Pec...
A sabiá fez um ninho no pé de ciriguela.
Pec... Pec... Pec...
O girimum com sua rama espalhada bota flores amarelas.
Miu... Miu...
As flores azuis da bomba d'água imitam o manto de nossa senhora de Conceição.
Miu... Miu...
Lá está ela a sabiá de papo laranja no chão.
Miu... Miu...
No galho da cirigueleira.
Pec... Pec...
Olhe ali o ninho filhotes.
Pec... Pec...
Um tirrite estralou seu canto amarelo,
Tire... Tire... Tire...
Seu ninho um saquinho na algaroba.
Tire... Tire... Tire...
A roupa seca na cerca.
Tire... Tire... Tire...
A Pinheira está cheia de pinha.
Tire... Tire... Tire...
Os sanhaçus voam no espaço feito jato.
Iç... Iç... Iç..
O sanhaçu achou a pinha madura.
Iç... iç... Iç...
A pinha verde por fora e alva por dentro.
Iç... Iç... Iç...
O alvo mais doce que existe.
Iç... iç... Iç...
A fruta madura da palma.
Iç... Iç... Iç...
Cantou lá pra cima a patativa.
Tric... Tric... Tric...
De peito amarelo e sobrancelhas alvas tão maneira.
Tric... Tric... Tric...
Pousada não se põe parada parece uma agulha na mão de costureira.
Tric... Tric... Tric...
O umbuzeiro de Elite de Palmira tá que é só imbu no chão.
Pec... Pec... Pec...
Aquela calda verde agridoce da fruta que gostosura.
Pec... Pec... Pec...
O Juazeiro de folhas cartáceas amargas com tá coberto de juá.
Quiro... Quiro... Quiro...
Na ceriguela mia o sabiá.
Pec... Pec... Pec...
Fruta amarelada babona a fruta do juá.
Tziu... Tziu... Tziu...
A frutinha vermelha da maria-reta.
Tziu... Tziu... Tziu.
Levanto e paro de pensar.
A realidade virou saudade.
Tziu... Tziu... Tziu...
A roupa já secou na cerca.
Acorda que o inverno mal começou.
Vincas
Roberto plantou vincas no nosso jardim,
Plantou vincas alvas e depois vincas rosas.
Tenho uma longa memória das vincas,
Será provável que foi o odor que se apegou ao meu cérebro?
Papai cuidava das vincas
Quando ia lá eu cuidava dela,
Pensava um pouco de água por algumas flores.
Na terra arenosa e seca crescia e cresce a vinca,
Quando a gente coloca a água a terra chupa tudo e não deixa nada.
Em 2010 tinha água de sobra do porção,
Agora a gente fica racionando a água
Enquanto as vincas sedentas crescem nas beiras das calçadas,
Crescem aos montes no inverno nos monturos,
Algumas sobrevivem e outras não,
Adoro as vincas,
Adoro sua resistência,
Suas folhas brilhosas,
Seu odor esquisito,
Dizem que seu alcaloide cura até leucemia.
Por enquanto enfeita minha tristeza,
Me faz sentir em paz.
Meu querido e velho amigo.
Agora já não tenho um parceiro para ouvir Nelson Gonçalves.
Mamãe já não pode nos chamar de Manés.
Já não podemos sentarmos juntos nas cadeiras de balanço na calçada da frente.
Restam apenas as paisagens e as músicas de Nelson que posso ouvir sempre que quiser lembrar de ti.
Lembra que te dei um cd e falou que era o melhor presente que tinha ganhado.
Naquele aniversário seu, naquela noite de natal, tomou umas a mais.
A gente riu, pena que não bebi contigo.
Mas ouço sua voz e seu riso.
A partir daquele dia sempre ouvia Nelson contigo no intuito de viver um pouco se seu orgulho
de sua juventude, sua boemia e contavas as mesmas histórias.
Com a idade a gente vai se acomodando e contando as mesmas estórias.
Era a mesma coisa sempre que ia a casa de João de Licor... as mesmas estórias.
A gente conta a mesma estória tentando não apagar o passado.
A gente tem muitas ilusões.
Mesmo sabendo que tudo aqui é passageiro, continuamos sendo os mesmos anos a fio.
E as vezes descobre que as verdades são castelos de areia.
A gente descobre que sistemas de classificações são apenas ideias que nos norteiam.
No final tudo é orgânico e mortal.
Nem me incomoda se disseres que tenho péssimo gosto.
A gente gosta de coisas simples, aquelas que a gente entende.
Aquela que a gente busca gostar ou entender talvez a gente ame.
Ou não.
Lá em Serrinha está chovendo.
Lá em Serrinha está frio.
Não tem xerém que aqueça nossos corações,
O que aquece meu coração e é a saudade,
Não teve que não me perguntei por que partiu?
As lágrimas inundam meus olhos,
Um aperto espreme meu coração.
Aqui estou papai ouvindo seu cantor favorito que agora é meu favorito.
Sei que o sentido de seu gostar era adverso do meu gostar,
Mas meu gostar é meu amor por ti.
Nem um xerém aquecendo o estômago,
Nem sua voz amiga e pacata,
Nenhuma semente de milho ou feijão na terra.
Ali fora geme Vinícius... Um dia certamente saberá tudo sobre ti.
Em meio a essa profunda saudade,
Estou feliz pela chuva que cai,
As sementes germinarão,
As matas crescerão,
E me emocionarei sempre com Nelson Gonçalves.
Mozart compôs como ninguém,
Gogh pintou como ninguém,
Borges escreveu como ninguém,
Algumas coisas vem a minha mente sobre os melhores.
Papai foi um pai como nenhum outro.
Agora que partiu, sinto muito a sua falta.
De Mozart tenho a música,
De Gogh tenho a pintura,
De Borges a escrita,
De papai tenho o respeito, o carinho e o amor e a saudade.
Que saudade de papai ouvindo Mozart.
As vincas continuam vivas no nosso terreiro.
Quantos cachorros e gatos se foram nessa nossa vida.
Tudo que ganhei e tudo que perdi,
Quem fui e quem sou,
É a soma de minha vontade,
É a soma de minhas representações.
A maior parte das coisas não compreendo,
Só sei que meu amor paterno é eterno
E dói demais sua ausência.
Dentre as formas de representar, talvez a escrita seja a mais complexa.
Todavia há aqueles que usam a fala para se expressar.
Sabem com destreza como organizar as palavras com sentido e beleza.
São os poetas populares que sabem como usar a palavra para se expressar,
A palavra que é a substância da fala,
E falam sobre tudo que há, desde a natureza humana a natureza da terra.
Então me ponho a matutar sobre o sentido de representar de organizar o nosso entorno em palavras?
Não sei se há um sentido, mas se encontra um sentido ao representar.
A inteligência humana não tem como parar.
E assim uns se expressam outros entendem e outros não estão nem ai.
A totalidade é isso o todo a falta e a presença,
Silêncio e palavra...
Acordei na madrugada e ouvi o sabiá cantar.
Ninguém o avisou que era domingo.
Cantou e cantou no sossego da madrugada.
Enquanto limpava meu menino
Ouvia aquele sabiá.
Então lembrei de outros sábias em outros lugares.
Na copa da aroeira,
No pé de cajueiro,
No solo do jardim.
Quem me conhece sabe que amo sabiá.
Depois apareceram os sanhaçus
Depois cai no sono
Sabiá doido, trabalhando num domingo.
A casa A casa que morei Onde mais vivi, Papai quem a construiu, Alí uma flor mamãe plantou, Ali vivi os dias mais plenos de minha vida, Min...