quarta-feira, 3 de novembro de 2010

O curral

Desde que sou gente, vejo como meu pai dar um jeito nas coisas lá de casa, nas portas, na cangaia, nas ancoretas em tudo. Meu pai sempre arrumava as coisas com um pedaço de arame e a troquesa velha. Nunca vi uma troquesa igual só papai tinha ali naquele povoado, as pessoas tinha alicates, mas troquesa so papai. Enfim não era diferente no curral. O curral de nossa casa ficava a uns 300 metros de casa, não dava sequer para ouvir o badalo do chocalho tinindo. Só as vezes quando a vaca paria e ficava lambendo a cria. Quando as vacas estavam prenhas, uma forma de saber se o bezerro nascera a noite bastava ouvir o soar intermitente do chocalho e já sabíamos que a vaca pariu. Então papai como era homem corajoso, saia na escuridão para conferi. Levava na mão uma lamparina, não deixava nos irmos juntos, ia sozinho. E quando chegava anunciava que era bezerro ou bezerra. Era muito bom saber que a vaca parira porque em pouco tempo teríamos leite a vontade pra tomar com café, pra comer com cherém de milho ou com cus-cus. Uma vaca era uma fartura. Papai sempre teve um gadinho pouco mais tinha. A primeira vaca que tenho na memória que papai possuiu foi careta que tinha esse nome por ter a cara branca e o corpo preto, parecia que fazia caretas. Foi a melhor vaca que papai teve. Era muito boa de leite e muito mansa. As vezes mamãe ia tirar leite e ela mesmo que arriava as pernas de careta. Nunca deu um coice. Já a filha de careta a novilha que mancava de uma perna era muito arisca corria atrás de quem era mole. Não gostava da novilha, lembro que papai vendeu e mataram ela lá no curral mesmo. Nunca gostei de ver matarem animal. Não olhava nunca. Papai também não gostava de ver. Depois papai vendeu careta não por açougue, vendeu a um comerciante, não queria saber que mataram careta. Papai gostava muito daquele animal. Bem outra vez papai comprou uma vaca velha, muito boa de leite, com chifres grandes. Veio o inverno e papai foi para São Paulo e colocou ela no sertão numa manga. A vaca já era velha e morreu no certão, parece que ela comera tinqui, uma planta venenosa, que mata o animal de barriga inchada. Uma vez papai comprou uma vaca preta de Levi lá em Pau dos Ferros essa vaca era muito boa de leite, e mança. Na seca de 1993 a situação ficou muito ruim papai vendeu todo o cercado e ficou só com essa vaca e a bezerra dela. A coitada passou muito mal comia rama árvores que ia buscar na cerra de Zé da Maniçoba. Comia rama de Anemopegna e de Copaifera não sei como não morreu. Papai comprava um saco de resídio era com que escapava, dava pouco leite isso mesmo tinha o gosto forte das plantas. Por não lembro mais do gado de papai. Lembro do curral. Aquele curral velho e simples. Com madeira velhas e tortas sustentando a cerca. Uma cocheira que caíra várias vezes, mas papai ajeitava sempre novamente. O curral era dividido em duas parte uma para o gado solteiro com uma cocheira divida em dois lugares um para colocar água e outro para por ração. E o lado maior para as vacas leiteiras. Tinha uma porteira velha no nascente e o poente era fechado sempre de cochete. divida por uma porteira que papai fazia.
O solo tinha barro vermelho, e era preciso quase sempre tirar o pau originado das fezes das vacas. Aquele pau quando estava seco cheirava muito. Gosto do cheiro de esterco de gado. Era alí que nos tirávamos parte de nossa alimentação de nosso sustento, quando era inverno sobrava leite, então lá ia eu vender leite na cidade, pra comprar alguma coisa pra casa. Eu era péssimo vendedor, tinha vergonha de gritar pra freguesia anunciando a mercaduria. Imagina que já cheguei a voltar com leite. Era muito ruim vendedor. Eu e minha vergonha. Dinheiro branco. O dinheiro do leite e dos ovos que vendíamos eram sempre da mamãe, pai nem via a cor. Foi do curral que tiramos dinheiro, foi de lá também que tiramos pau para adubar a terra de nosso sítio.
Naquela vida todos que ali moravam viviam da mesma lida. Era o curral uma forma de economia rural.

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